terça-feira, 22 de maio de 2012

A menina ainda dança

Sal e limão. Duas doses de tequila. Ela bebe pra esquecer que nesta noite alguém a observa, que há um olhar sobre ela, que há um depois. Ela só quer se entregar à música, fazer o corpo entrar naquela cadência. Sem pensar no que o movimento sinuoso do seu corpo libertaria, provocaria. O que desperta? "É sexta-feira, amor!". Seu corpo quer apenas brincar, sentir a batida, dançar na mesma frequência.  Quer festar, celebrar, pedir passagem. Seu corpo quer jogar com o corpo das outras meninas que se divertem, quer entrar no compasso do corpo dele, sem pretensões. Rir, flutuar, seguir linhas curvílineas.

Ela se sente leve, rarefeita. Livre. Não há observador, julgamento ou moral. O corpo dele se entrelaça no seu, sem pudor, sem temor. Ele entrara pra brincadeira, também só se divertia, adentrara na música por completo, pés no chão, mente no ar. Transbordavam. A dança era de dois, um encontro. Estavam em um ritmo só. Braços, pernas e quadris. O calor que rondava e envolvia ambos fez pele transpirar em festim. 

Do fogo de um baile quente eles se foram pra friagem de uma madrugada descoberta. Naqueles dias eles se viram como nunca antes. Sentiram como nunca antes. Ele viu olhos de faísca, corpo em requebre, láscivo. Calor. Ela viu o que antes eram pontos cegos, ele permitiu que ela olhasse bem profundo, se mostrou quebradiço. Sem márcaras de segurança trocaram dores e traumas. Fazia muito frio, o ar era gélido, mas não se feriram. Não havia pesar, ainda transbordavam. O sol nascia. Céu, sal e limão.


"No canto do cisco
 No canto do olho
 A menina dança

 E dentro da menina
 A menina dança
 E se você fecha o olho
 A menina ainda dança
 Dentro da menina
 Ainda dança

 Até o sol raiar
 Até o sol raiar
 Até dentro de você nascer"

A menina dança - Novos Baianos

SER



EU

Até agora eu não me conhecia,
julgava que era Eu e eu não era
Aquela que em meus versos descrevera
Tão clara como a fonte e como o dia.

Mas que eu não era Eu não o sabia
mesmo que o soubesse, o não dissera...
Olhos fitos em rútila quimera
Andava atrás de mim... e não me via!

Andava a procurar-me - pobre louca!-
E achei o meu olhar no teu olhar,
E a minha boca sobre a tua boca!

E esta ânsia de viver, que nada acalma,
E a chama da tua alma a esbrasear
As apagadas cinzas da minha alma!


Florbela Espanca





 LXIX

 Talvez não ser,
é ser sem que tu sejas,
sem que vás cortando
o meio dia com uma
flor azul,
sem que caminhes mais tarde
pela névoa e pelos tijolos,
sem essa luz que levas na mão
que, talvez, outros não verão dourada,
que talvez ninguém
soube que crescia
como a origem vermelha da rosa,
sem que sejas, enfim,
sem que viesses brusca, incitante
conhecer a minha vida,
rajada de roseira,
trigo do vento,

E desde então, sou porque tu és
E desde então és
sou e somos...
E por amor
Serei... Serás...Seremos...

Pablo Neruda




Não coloco em palavras a intensidade do ser
do estar, do viver.
A fluidez da experiência - imagens sobrepostas
em ritmo alucinante.
Imagens que evocam gostos, cheiros, luzes, sons, toques
não ouso descrever.
Meu corpo-mente experimenta, prova, investiga, contempla 
é tudo novo.

Sem parâmetros, sem referenciais.
Sem caminhos já trilhados.
Sem comparativos.
Sem chão, sem direção.
Sem sentido.
Com-sentir.
Só descobrir.
Desbravar.
Saborear.

Descortinar-me.
Conhecer-te.
Só.
Só?



domingo, 6 de maio de 2012

O natural é se arriscar, ele me disse. E o caminho mais ardiloso escolhi.
"O bom não é a paz, o equilíbro, a tranquilidade. O bom é aquilo que está em consonância com a nossa natureza, que é de lutar, de ousar, de pular pro desconhecido."
Você disse que eu deveria quebrar as pernas, e fazer tudo cair. Tudo. Criar.
Acho que é isso que agora eu vivo. Um salto, uma queda. Me quebras. Era o que pretendia, não? Quebrar, molhar, arrepiar...
Quebra de todos os paradigmas, as verdades. Dúvida de mim em cada interrogação que me traz. Quem somos? Quem sou? Estamos pra quando, por quanto?
Infinidades de descobertas. Sinestesia. Micro-múltiplas sensações.
Quebras.
Mudança. O novo, sempre, todo dia.

Entrei pra roda e ginguei. Menino, acompanha meu passo?